quinta-feira, 9 de julho de 2009

Juventude Negra de Londrina – caminhando para a polítização

Texto enviado ao Jornal Cincão Noticias – Londrina.

Em Londrina, atualmente, existem algumas entidades e grupos de juventude que lutam por direitos humanos, principalmente contra o racismo, sexismo, e intolerâncias correlatas. Dois destes grupos que estão se estruturando e são o COJUNE – Coletivo da Juventude Negra de Londrina e o UJAL – União da Juventude Afro de Londrina.

A população precisa se organizar para pensar a sociedade que se quer construir. Vivemos um momento de grandes debates e preocupações acerca da onde de violência que assola a sociedade como um todo, violência que antes era restrita aos bairos periféricos e que agora atingem os bairros mais elitizados. Enquanto a violência era um assunto que envolvia bairros periféricos, que predominância de moradores pobres e negros, não havia muita preocupação por parte dos gestores públicos. Quando esta violência se ampliou atingindo ricos e pobres, graças às profundas desigualdades sociais principalmente quando é analisada a situação da população negra e das mulheres, despertou grande preocupação por parte do governo federal, estadual e municipal. Desde então vêm ocorrendo conferências de segurança pública organizadas por órgãos governamentais, vêm sendo criadas leis para tentar conter a violência urbana, e outras ações no sentido de coibir a onda de crimes e violência que hoje atinge a sociedade como um todo.

O grande problema é que, como sempre acontece, a população não foi consultada. Nesses processos políticos, a sociedade cívil pouco tem participado para auxiliar na formulação de políticas para a promoção de uma sociedade mais justa e menos desigual. Desta maneira, nós da juventude negra entendemos que para que haja uma efetiva mudança na realidade da nossa sociedade, a população deve participar dos processos políticos, como as conferências que vêm sendo realizadas (conferências livres de Segurança Pública, de Promoção da Igualdade Racial, de Comunicação, de Saúde, etc..), pois é a população, principalmente os moradores das regiões periféricas, que tem conhecimento de causa sobre a violência urbana e as desigualdades sociais, e sabem quais os problemas pontuais que devem ser superados para que construamos, de fato, uma sociedade mais humana.

Estamos nos organizando, COJUNE e UJAL, para que possamos através da militância por direitos humanos lutar contra o racismo, contra a reprodução de intolerâncias, e contra as desigualdades sociais, através de ações como reuniões, organizações de eventos de debates, articulações com outros movimentos sociais e grupos culturais. Convidamos a todas e todos para juntarem-se a nós. Para tanto, devem entrar em contato conosco pelo e-mail: nettosilverio@yahoo.com.br ou pelo telefone (43) 842619030.

segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Esporte e política

José Evaristo Silvério Netto

O esporte é um fenômeno da maior importância na sociedade contemporânea, não há como não aceitar este fato. Os meios de comunicação utilizam os eventos esportivos para ganhar audiência, gerar lucros com propagandas, direitos de imagem, ...; o esporte movimenta milhões de reais todos os anos, é responsável por milhões de empregos diretos e indiretos. Segundo o plano pluri-anual 2004-2007 do governo federal (UNESCO, 2004, p.174) o Ministério dos Esportes investiria 387 milhões de reais em programas para o fomento do esporte nacional.

Mas o poder econômico não é a unica justificativa da sua importância social. O esporte provoca em todos os envolvidos em sua prática (atletas, profissionais do esporte, espectadores) fortes emoções, sentimentos, motivações. O esporte faz rir, chorar, zangar, chingar, e elogiar. O esporte faz amar. Segundo Knijnik e Knijnik (2004),

esporte influencia de forma
descomunal as sociedades
porque se faz presente no
imaginário dos povos e
movimenta fortunas direta
e indiretamente, causando
paixões poderosas e tendo
história e significação
próprias.

Quando um atleta, um ídolo de uma nação, se posiciona politicamente frente a um acontecimento marcante na sociedade, gera polêmica e muita reflexão. Os atletas são formadores de opinião, são indivíduos escolhidos como ídolos pelos admiradores e espectadores do esporte, são pessoas que possuem uma grande influência ou possibilidade de mudar hábitos e comportamentos sociais. Um exemplo clássico foi o esquisito corte de cabelo do jogador de futebol Ronaldo (o fenômeno) quando deixou um "topete". Logo, aquele corte virou moda entre os adolescentes que o admiravam, e não foram poucos.

Um aspecto interessante do esporte é que ele quebra a lógica ocidental e capitalista de pensar, de viver. Segundo Damatta (in: trancrição de palestra no Seminário Internacional Esporte e Sociedade) as atividades esportivas e artisticas subvertem a relação entre os meios e os fins, típica da sociedade capitalista. Desta forma os meios tronam-se mais importantes que os fins, desequilibrando o esquema de racionalidade, e entrando

 

 

num universo simbólico puro,
onde há bandeiras, onde se
gasta dinheiro comprando uma
entrada para uma atividade
sem finalidade objetiva.

Infelizmente no nosso país o futebol é hegemônico quando o assunto é esporte, antes fosse o taekwon-dô de Diogo Silva (aquele que imitou o gesto dos panteras negras, símbolo da luta anti-racista). Desta forma, "topete" do fenômeno, no país do futebol e do racismo foi um sucesso virando uma marca, uma patente, em detrimento dos punhos cerrados de Diogo Silva, simbolo da luta anti-racista por direitos humanos da população negra que no nosso país só representa 50% da população, que foi transfigurado a uma ofensa às entidades esportivas institucionais. Nada contra o futebol, pelo contrário, todos nos emocionamos com uma partida televisionada. Mas que bom seria termos atletas conscientes, politizados, ...militantes.

Referências:

  • Unesco - Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura. Políticas Públicas de/para/com Juventudes. 2ºedição, 2004, Brasília – DF.
  • Damatta, R. O Esporte e o Jogo Como Formadores de Comportamentos Sociais. Trancrição de palestra em: Seminário Internacional Esporte e Sociedade.
  • Knijnik, JD; Knijnik, SF. Sob o Signo de Ludens: Interfaces Entre Brincadeira, Jogo, e os Significados do Esporte de Competição. Revista Brasileira de Ciência e Movimento. 2004; 12(2): 103-09.

Qualidade de vida na sociedade desigual: primeiras considerações


José Evaristo Silvério Netto

Viver bem em tese é o objetivo de todas as pessoas. Viver com boa saúde, sem doenças, ser feliz, trabalhar com o que lhe dá prazer, se relacionar com pessoas que te amam, ter dinheiro e conforto, ser respeitado e admirado, dentre outros desejos, constituem o pool de motivos que direcionam nossas ações cotidianas. Desde pequeno, quando cursava o ensino fundamental, quando treinava atletismo, quando saia para baladas, ou quando paquerava alguma garota, eu estava consciente ou "subconscientemente" sendo norteado pelos desejos supracitados. O que mudou de lá para cá foi minha visão de mundo. Hoje com 27 anos, mais maduro e consciente do mundo ao meu redor, continuo tendo os mesmo desejos e motivos de viver com boa saúde, sem doenças, ser feliz, e assim por diante, mas minhas atitudes são diferentes devido a experiência de vida acumulada. O que acho interessante é que o motor primário das minhas ações (motivações) não se alterou desde a época de infância.

Entendendo as ações ou atitudes humanas por este âmbito, podemos concluir que é fácil, ou simples, agir em conformidade com o objetivo universal de viver bem. Mas incorremos em grave erro porque desta forma estamos considerando o indivíduo como um ser padronizado, sem diferenças. Desta forma também estamos desconsiderando as desigualdades sociais, problemas como machismo, racismo, e muitas outras desumanidades, que prejudicam a construção da personalidade individual e minam as ações dos seres humanos. Ser um homem preto na nossa sociedade significa ser uma pessoa muito mais susceptível a sofrer violência física quando comparado a um homem não-preto; significa ser muito mais susceptível a ser desconsiderado intelectualmente por outras pessoas; significa ser colocado na condição de objeto sexual; significa ser uma pessoa que a todo o momento precisa provar que é capaz, que é inteligente, que é bonito, provar para os outros e para si próprio!

Tentando concluir esta confusa reflexão, retorno ao primeiro parágrafo e penso sobre o conceito Viver Bem. Viver bem é tudo aquilo que escrevi na segunda oração do primeiro parágrafo, e muito mais. Acredito que homens e mulheres, pretos e não-pretos, de religiões diverPESTAN~1sas, de culturas diversas, se questionados sobre "o que é Viver Bem" responderiam algo parecido ao que escrevi. Mas, se questionados sobre "como Viver Bem", ou "o que fazer para Viver Bem", ou mesmo sobre "se tem chances de Viver Bem" as respostas seriam diferentes. Faço a seguinte pergunta: é possível a uma pessoa preta ter boa saúde em uma sociedade racista? O conceito de saúde segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde) é a de que Saúde é um construto biopsicosocial, portanto amplo, e que se configura em um continuum onde em uma ponta está saúde positiva e na outra está a saúde negativa e a morte. Sofrer racismo prejudica a saúde positiva dentro das três dimensões do construto de saúde (dimensões biológica, psicológica, e social - biopsicosocial). O prejuízo dentro da dimensão biológica se dá desde agressões físicas como por exemplo os casos de violência policial, até patologias psicossomáticas como são as "falhas" do sistema imunológico aumentando o estabelecimento de diversas doenças, e a hipertensão arterial. Em se tratando da dimensão psicológica e social, o aumento exacerbado do estresse, depressão, baixa auto-estima, e baixa auto-eficácia, são exemplos de prejuízos específicos. O livro de Maurício Pestana entitulado Manual de Sobrevivência do Negro no Brasil (figura acima) é um importante aliado para a tomada de consciência sobre a dificuldade em viabilizar a promoção de qualidade de vida da população negra em uma sociedade racista.

Viver bem se relaciona com um termo muito usual e estudado na área da saúde, Qualidade de Vida. Agora sim concluindo, parece-me extremamente difícil ter qualidade de vida sendo vítima do racismo, do machismo, e de todas as desumanidades inerentes a nossa sociedade. É necessário pensar em políticas públicas para a promoção da qualidade de vida de populações historicamente vitimadas. É necessário que os gestores públicos absorvam estas idéias em seus programas de governo, pois só assim aumentar-se-á a qualidade de vida geral da sociedade brasileira e mundial, dentro de políticas regionais e globalizadas.